Sábado, 22 de fevereiro, horário do almoço na cidade de Pádua, a 35km de Veneza. Pela porta da frente, o diretor do restaurante passa apressado, com o olhar preocupado e surpreso: “a fila do mercado está enorme. As pessoas estão fazendo compras como se fosse o apocalipse chegando.”
A visita, no entanto, era outra: na noite do dia anterior, havia sido anunciada a primeira morte no país por decorrência do coronavírus. A vítima foi um senhor de 78 anos que sequer teve tempo de ser transferido ao hospital da capital; ele faleceu na cidade de Schiavonia, a 32km de distância de Padova.
O restaurante, no Centro da cidade, costuma receber ao menos uma centena de clientes para o almoço no fim de semana. Mas, nesse sábado, eram tantas as mesas vazias que alguns funcionários foram orientados a terminar o turno mais cedo.
Pela vitrine do restaurante já se percebia, mas o caminho até casa confirmou que a cidade estava com uma movimentação estranha; ou melhor, uma movimentação escassa. Muita gente parecia ter decidido passar o fim de semana recluso diante do anúncio da vítima do coronavirus tão próxima. Isso era especialmente visível nos bares, que, para um sábado à noite, sofriam com a falta de público.
Em um estabelecimento localizado numa área universitária, uma das sócias lamentava que o medo fizesse com que as pessoas deixassem de sair de casa. Na semana seguinte, estavam agendados alguns eventos que costumam atrair mais de 80 pessoas – um grande número para um restaurante pequeno, com cerca de seis mesas. No domingo à noite, após uma tarde em que a cidade, normalmente cheia de famílias e grupos de amigos passeando pelo Centro, esteve ainda mais vazia, todos foram adiados.
Também foi no domingo à noite que o governo da região do Veneto anunciou medidas de emergência que trouxeram impactos mais facilmente perceptíveis no dia a dia, já visíveis na manhã de segunda-feira, com o aumento considerável do número de pessoas usando máscaras, lojas e restaurantes fechados e, principalmente, as ruas ainda mais vazias.
Até o momento, as atividades comerciais não estão suspensas – ou seja, mesmo com poucos clientes, as lojas e restaurantes podem permanecer abertos. Por outro lado, tudo que envolve aglomeração de pessoas está suspenso no Veneto, como missas, feiras, eventos esportivos, cinemas, teatros, escolas, universidades e baladas. Até as comemorações de Carnaval foram impactadas: o Mercoledí Grasso, encerramento da festa em Veneza, foi cancelado, bem como o próprio Carnaval de Padova, que ocorreria no dia 23 de fevereiro.
No entanto, o Veneto não é a única região afetada pelo vírus na Itália, que é o terceiro país com mais infectados. Na Lombardia, está o recorde de pacientes, que já são mais de 172. Foram registradas, até agora, cinco mortes na região. Há também casos na Emilia-Romagna, no Piemonte e em Trentino-Alto Ádige.
Ainda na Lombardia, há 10 comunes isolados, com bloqueios nas estradas e a recomendação de que seus moradores não saiam de casa: Codogno, Terranova, Castiglione, Casalpusterlengo, Somaglia, San Fiorano, Bertonico, Maleo, Castelgerundo e Fombio.
Coronavirus: como se prevenir
Todos devem seguir as recomendações do governo, mesmo sem apresentar sintomas e sem ser parte do grupo de risco, para que a contingência do vírus tenha sucesso. Isso porque devemos ter responsabilidade social: quem é jovem e saudável pode levar o vírus ao grupos de risco. Obedecer às restrições de circulação contribui para que o controle do vírus seja feito da forma mais rápida e eficiente possível.
Como em toda situação do gênero, também há fake news sendo espalhadas, aumentando o alarmismo e o pânico. Um áudio no WhatsApp diz que a situação é muito mais grave do que o governo diz, que já foi perdido o controle do vírus e recomenda que as pessoas estoquem comida em casa, porque as próximas semanas serão de isolamento total. Nem precisa dizer que pânico não ajuda nada, e difundir mensagens do tipo só piora a situação.
Mas, conspirações à parte, esvaziar prateleiras dos mercados é, além de ineficiente, irresponsável, porque faz com que as outras pessoas, que também precisarão de comida, produtos de higiene e de limpeza, não consigam comprá-los.
Coronavirus: o que fazer
As recomendações do governo são:
- Lavar as mãos com frequência
- Evitar o contato próximo com pessoas que sofram de infecções respiratórias agudas
- Não tocar olhos, nariz e boca com as mãos
- Cobrir boca e nariz ao tossir
- Não tomar antibióticos e outros remédios sem prescrição (vale lembrar que antibióticos são ineficientes contra vírus)
- Limpar as superfícies com desinfetantes à base de cloro ou álcool
- Usar máscaras somente se houver a suspeita de estar doente, ou caso cuide de alguém doente
O governo ainda lembra que produtos e pacotes vindos da China não são perigosos. Animais domésticos também não difundem o vírus.
Recomenda-se, a quem esteve em viagem pela China há menos de 14 dias, de procurar assistência pelo telefone 1500, um número criado especialmente para a epidemia. Para residentes da Lombardia, há um número exclusivo: 800 89 45 45.
Também é importante que quem apresentar sintomas como tosse ou febre não se dirija ao pronto-socorro, pois pode acabar contaminando mais pessoas; em vez disso, convém ligar no mesmo número para pedir orientações e/ou procurar seu médico da família.
Este post foi escrito e publicado no dia 24 de fevereiro de 2020. As informações contidas nele são as que foram divulgadas até esse dia, exceto eventuais atualizações que estejam sinalizadas ao longo do texto.
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