Para alguém que tem um blog de viagens, eu sou péssima em viajar. Cá entre nós, também não tenho sido muito boa em manter o blog de viagens, mas esse é outro assunto.
Odeio planejar o que fazer, não tenho paciência para aprender como funciona o transporte, e é comum me ver pedindo dicas no Instagram a caminho do local, para salvar tudo no Google Maps e me movimentar ao longo dos dias na base do “o que está perto daqui?” Fico sobrecarregada com tantas coisas para controlar em uma viagem que minha resposta é totalmente oposta: não vou controlar absolutamente nada.
O lado positivo é que meu namorado gosta de fazer o planejamento: assiste vídeos no YouTube, aprende a história dos lugares, pega dicas de onde comer e faz um roteiro para nós. Roteiro, claro, está sujeito a mudanças, e nossa viagem para a Sicília teve um percalço que a gente não imaginava, mas que acabou sendo a melhor opção, e que não teríamos planejado.
Sicília em uma semana: tempo contadinho
Tivemos a pouco sábia ideia de ir passar uma semana na Sicília em maio de 2023. Imaginamos que seria relativamente tranquilo de aproveitar uns dias na ilha ao sul da Itália que é praticamente um país à parte. Mas, ainda lá, percebemos que gostaríamos de ter tido pelo menos outra semana. Foi uma viagem gostosa, mas corrida, daquelas que você volta mais cansado do que foi.
Nosso roteiro era Palermo – Catania – Taormina – Palermo (para pegar o avião de volta para Londres). Isso daria cerca de dois dias por cidade, o que é possível, mas, como falei, não é a velocidade que gostaríamos de passar férias. Além disso, ter pouco tempo deixa muito pouco espaço para qualquer coisa que aconteça fora do esperado: um despertador ignorado, um atraso de trem e até uma indigestão poderiam mudar tudo num instante. Por isso, fomos com tudo relativamente bem planejado. Sabíamos os dias que estaríamos em cada lugar, e deixamos para comprar as passagens de trem quando estivéssemos lá. Como não era alta temporada, daria certo – e deu.
Chegamos de manhã em Palermo, fizemos um walking tour pela cidade de tarde e decidimos ir, no dia seguinte, a Cefalù, uma cidade de praia próxima. Palermo não tem praia, e queríamos passar um dia lagarteando na beira do mar. Então, de noite, compramos as passagens do trem, que custaram cerca de 6 euros cada, colocamos o despertador para cerca de uma hora antes, arrumamos a famosa Sacola Da Praia e fomos dormir.
No dia seguinte, acordamos na hora combinada, passamos protetor solar no hotel, nos vestimos e fomos até a estação. Nosso AirBnb ficava a menos de 10 minutos a pé, então decidimos que, no caminho, procuraríamos alguma padaria aberta para comprar uns cornetti e tomar o café da manhã no trem. Depois de uns cinco minutos de caminhada, achamos um lugar, compramos o que queríamos e seguimos andando – chegaríamos na estação sem muita antecedência, mas a poucos minutos da partida do trem.
A certa altura, distraída pela conversa, eu percebi que não reconhecia os arredores. Era para a estação estar ali na esquina, mas não via nem sinal dela. Então, abri o mapa no celular e estávamos o dobro da distância: tínhamos saído do AirBnb na direção oposta! Faltavam pouco mais de cinco minutos para o trem partir, e a estação ficava a cerca de um quilômetro de onde estávamos. Só havia duas opções: desistir de ir a Cefalù, ou correr e tentar pegar o trem.
Nós dois corremos com frequência, mas não éramos (ainda não somos) treinados o suficiente para correr num pace de 5:00/km de chinelo, com uma sacolona de praia e dois cornetti. Mas chegamos na estação no horário marcado. Infelizmente, o trem tinha acabado de partir, um minuto antes, segundo dois senhores que estavam na plataforma.
Recalculando rota
Me sentei num canteiro enquanto pensava no que fazer. Estava tão dominada pela ansiedade e pela frustração que sentia como se tivesse perdido o último voo de volta para casa e nunca mais fosse ver minha família; algo irremediável, terrível, sem precedentes e cujas consequências eu mal conseguia imaginar.
Meu namorado sugeriu tentar mudar a passagem para o próximo trem, ou pegar um reembolso. Nenhuma das duas coisas era possível: o próximo trem era dali a umas cinco horas, e eles não ofereciam reembolso para trens que já tinham partido.
Eu não tinha a menor ideia do que fazer agora. Como ficaríamos poucos dias em cada cidade, perder um passeio significava recalcular tudo já no primeiro dia da viagem.
Como meu namorado tinha planejado praticamente todas as paradas, ele também sabia o que tinha ficado de fora e propôs que incluíssemos um dia numa praia que havíamos tirado do roteiro: Mondello, que faz parte de Palermo mas fica a cerca de 40 minutos de ônibus do centro da cidade. Já estávamos com a roupa de ir, afinal, e o ônibus saía da estação mesmo.
Então, pegamos a fila – óbvio que não éramos os únicos a ter essa ideia, em um dia tão ensolarado no comecinho do verão – e embarcamos no ônibus cheio até Mondello.
Uma tarde em Mondello, em Palermo
Mondello é um bairro de Palermo que tem uma praia de areia de mesmo nome. É relativamente pequena e tranquila, com um mar raso, cristalino e quentinho. A peculiaridade é um restaurante que fica sobre as águas, uma construção exuberante de 1912 que originalmente era uma espécie de beach club e é o prédio do início deste post. Nós não tínhamos nem roupa para entrar, claro, mas ele ajuda a compor uma paisagem bem Verão Na Itália.
Em termos de infraestrutura, a praia não tem praticamente nenhuma, mas tem comércios no calçadão, onde você pode comprar o que comer ou beber e usar o banheiro.
Passamos o dia todo na praia e, quase no fim da tarde, voltamos para o centro de Palermo. O retorno foi um pouco mais burocrático que a ida, pois tivemos que sacar mais dinheiro (muitos lugares na Sicília aceitavam apenas dinheiro, então gastamos nossos trocados e ficamos sem para o ônibus) e esperar dois ônibus de volta. Novamente, não fomos os únicos a decidir ir embora nessa hora, e eles estavam totalmente lotados.
No fim, ir para Mondello foi inesperado mas bastante agradável, um ótimo descanso logo no começo da viagem.
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Última parada: Cefalù
Mas mais surpreendente ainda foi quando percebemos que, no caminho de volta de Taormina, poderíamos fazer uma parada em Cefalù – a cidade que não tínhamos visitado porque perdemos o trem. Afinal, Cefalù é penúltima parada vindo Taormina, após trocar de trem em Messina. E, como já tínhamos visto tudo que queríamos em Palermo, passaríamos o dia lá só matando tempo. Então, poderíamos acrescentar uma parada.
O plano foi pegar o primeiro trem do dia saindo de Taormina (é uma viagem de mais de três horas), passar o dia todo em Cefalù (com direito a ficar com nossas malas na praia) e, de lá, ir para Palermo para pegar o avião no outro dia de manhã. Por sorte, ou melhor, restrições das companhias aéreas, estávamos com pouca bagagem, então caminhar pela cidade com elas não foi de todo mal.
Visitar Cefalù foi um encerramento com chave de ouro para nossa semana na Sicília. A cidade é super antiga, com construções medievais preservadas até hoje, como o lavatoio – uma espécie de lavanderia compartilhada medieval -, o molo – o pier no final da praia – e a Porta Pescara – um portal que dava acesso da praia à cidade. O Duomo de Cefalù também merece ser visitado: construído em 1240, é um patrimônio mundial da Unesco e um exemplo tangível da influência bizantina, árabe e normanda na ilha que pode ser apreciada até hoje.
Falando de praia, essa foi a nossa favorita. A água é ainda mais rasa e morna que em Mondello e dá para andar bastante no mar com a água batendo na altura dos joelhos. A faixa de areia é bem extensa e larga e, mesmo cheia, não parecia lotada.
Também não há estrutura na praia em si, mas restaurantes a beira-mar. Quando visitamos, tinha uma feirinha acontecendo, onde pudemos até comprar cerveja artesanal e beber na praia. Com uma praia tão tranquila, é um ambiente super familiar; pontos extras por não ter ouvido uma única caixa de som!
No fim das contas, perder o trem acabou nos rendendo mais do que pensávamos no início da viagem. Com um pouco de flexibilidade, conseguimos rearranjar as paradas e ver até mais do que queríamos!
Fica a lição para mim mesma: é importante planejar, mas não a ponto de controlar cada segundo do roteiro sem espaço para imprevistos… E se adaptar às situações pode render uma viagem melhor do que você imaginava.